sexta-feira, 16 de junho de 2017

José Flórido


Não creio que se tenha sempre uma ideia correta do fenómeno cultural na nossa vida. Mas, quase todos nós falamos sobre a importância da Cultura: Às vezes, por exemplo, dizemos que determinado programa, apresentado num canal televisivo, é "cultural" e que outro o não é; outras vezes, empregamos a expressão "cultura geral" (sem que se saiba bem o que isso é), quase sempre de acordo com a ideia de "acumulação" de conhecimentos, básicos e geralmente superficiais, sobre variados ramos do saber. E se consultamos um dicionário, vamos encontrar, entre outras aceções, o conceito de Cultura como um conjunto de padrões de comportamento, crenças, conhecimentos, costumes, etc. Mas, talvez a ideia mais precisa de Cultura surja associada a Agricultura, que é, como sabemos, a atividade que tem por objetivo a preparação do solo, tendo em vista a produção de vegetais úteis ao homem.. De facto, sem uma cuidada preparação do terreno, as sementes lançadas à terra não poderão produzir plantas de boa qualidade. E o mesmo acontece connosco: Se a preparação intelectual, ética e estética for insuficiente, é impossível que os conhecimentos e as informações adquiridos, produzam pensamentos e obras de valor elevado. Pretendo com isto dizer que a Cultura não deve apenas ser concebida de um ponto de vista quantitativo, mas, sobretudo, qualitativo. A Cultura fundamenta-se em valores, expressa-se como valores e promove valores. Os valores são o património da humanidade ou de um povo, a experiência adquirida ao longo dos séculos, materializada nas suas realizações técnicas, científicas e artísricas. E o que devem promover esses valores? Devem promover a justiça, a paz, a beleza, a verdade e o amor. Contudo, não devemos perder de vista a relatividade dos valores. A lei do progresso implica muitas vezes a negação do que é, a ultrapassagem do que já foi adquirido e a sua substituição por novas realidades.
Concebida apenas de um ponto de vista quantitativo, a Cultura tem vindo a perder a sua dimensão espiritual, dando lugar ao "culto das exterioridades", porque a simples acumulação de conhecimentos, de factos, de informações e de "coisas" apenas pode contribuir para degenerar ou eliminar a nossa capacidade criadora. Tem razão, por isso, a tradição budista quando afirma que "o acúmulo de conhecimento sobre conhecimento serve somente para aumentar a ignorância".

José Flórido
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