terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

AS MINHAS PRIMEIRAS FÉRIAS


E as férias estão a chegar ao fim, com dias solarengos que mesclam a lezíria de brancos e amarelos de encantar; amanhã começa o segundo período. 

No entanto, estou certo que o trabalho será naturalmente cumprido com o ânimo de quem encheu o espírito com brincadeiras e devaneios de um João Pestana ao outro. 

E o vento, esta tarde, tomou a liberdade de pintar um fundo de azul no céu. 



Tarde que foi de separação da família o que também faz bem. 

A Amélia convidou as miúdas para irem ver o Nemo com a Beatriz e, claro está, mesmo em face do bis, elas aceitaram de imediato. 
A Luísa também se dirigiu para o cinema para ver uma película com a Lúcia Moniz. 
Eu, como tinha de escrever um artigo e passar outro para a disquete, fiquei em casa. 



Desastre aéreo no Egipto sobre as águas do Mar Vermelho. 
A tripulação e os cento e quarenta passageiros encontraram a morte depois de uma queda que ainda não tem explicação certa. 
Como a maioria eram turistas franceses, a França está de luto. 



E agora discute-se a liberalização dos preços dos combustíveis. 
Para já, as preocupações vão no sentido do aumento dos preços que isso acarretará. O Presidente da DECO alertou para a previsível alta no interior onde, naturalmente, a procura é menor. 
Pois quanto a mim não me parece que existam motivos para alarme. Este é um dos níveis em que os mercados costumam funcionar no sentido do equilíbrio e do melhor serviço ao Cliente e depois não nos podemos esquecer que a concorrência acabará por se fazer entre postos de abastecimento e não apenas entre as marcas. A médio prazo, é de esperar que, se as alcavalas dos impostos não influenciarem o processo, as baixas no preço dos combustíveis se venham a traduzir em diminuições de custos para os consumidores. 
Quanto aos prejuízos para o interior, a acontecerem – de todo indesejáveis já que avolumariam os custos da litoralização do país – será da competência dos poderes políticos tomarem as medidas necessárias que permitam dirimir um tal impacto negativo. 

Mas como em Portugal nunca se sabe, o melhor será esperar para ver. 



Pois lá para os lados da Geórgia tudo indica que os reformistas ganharão as eleições, mas o mais provável será continuarmos perante um regime de opereta. É que nas regiões autónomas continuam governos que não reconhecem o novo poder e, ao contrário deste, insistem em permanecer na órbita de Moscovo. Além disso, a corrupção é endémica por aquelas paragens o que corta as pernas à democracia mal esta se levanta. 

Tudo isto é resultado da falta de coragem com que no Ocidente se deixou cair Gorbatchov e toda uma economia em colapso e a saque, sem qualquer plano de ajuda e reconversão, sem que o necessário controlo das garantias de contra-partidas políticas e sociais sequer tivesse merecido um debate, quanto mais definido e posto em prática. 

E enquanto a Rússia não estabilizar uma sociedade democrática, a antiga constelação do Império Soviético permanecerá um buraco negro para tudo o que a nossa civilização tenha de pior. 


Também na Sérvia decorre uma disputa eleitoral e igualmente existe o perigo de uma deriva caótica numa sociedade em que o pensamento e a cultura democrática são incipientes e o discurso nacionalista continua a fazer sentido. 


Salva-se a aproximação inesperada entre a Índia e o Paquistão que decidiram conversar sobre Caxemira. 



E amanhã lá os meus anjinhos retomarão as suas responsabilidades. 

Tranquilidade e empenho são esperados com toda a naturalidade. 

Eu nunca me esqueço de agradecer a Deus as queridas filhas que tenho e de Lhe pedir que as Ilumine.

Louvado seja Ele. 



E com isto, a Matilde cumpre as suas primeiras férias. 


Alhos Vedros 
  04/01/2004

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

REAL... IRREAL... SURREAL... (244)

Venho por este meio pedir desculpa aos
meus amigos, Monet, Picasso, Klimt e Schiele,
por ter estado tão perto deles no dia 24 de Fevereiro de 2017
e não os ter ido visitar.
Foi porque não tive, mesmo, tempo…



sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Uma breve reflexão sobre Krishnamurti


     José Flórido

     Como pretexto para uma breve reflexão sobre Krishnamurti, vou começar por me referir à controvérsia entre Salih e Rabiya, dois iluminados mestres sufis:
     Salih dizia aos seus discípulos (tal como Jesus também o disse) para não cessarem de "bater à porta que alguém a viria abrir". Que significado tem "bater à porta"? Na linguagem dos místicos "bater à porta" significa o trabalho persistente sobre nós próprios, no sentido de procurar a verdade. Trabalho que inclui, para além da oração e da meditação, muitas outras atividades, como o estudo de obras filosóficas e religiosas, as palestras, as conferências e até mesmo aquilo que costumamos designar por "serviço".

     Ora, enquanto para Salih era indispensável "bater incessantemente à porta" a fim de se alcançar a autorrealização, para outro grande mestre, Rabiya, tratava-se de um procedimento completamente inútil e absurdo. "Quantas vezes precisas tu de dizer a mesma coisa? - perguntava Rabiya. Porque estás sempre a insistir na necessidade de "bater à porta"? Ora, a porta já está aberta. A porta sempre esteve aberta. É portanto tolice bater a uma porta que já está aberta."
        
      Dois mestres iluminados. Duas opiniões contrárias. Qual deles tinha razão?
      À primeira vista, não parece plausível que dois mestres da dimensão de Salih e de Rabiya estivessem em total contradição. Quem estaria certo? De acordo com a nossa lógica, um deles, deveria estar errado. Se Salih considerava que era necessário "bater incessantemente à porta" e Rabiya dizia o contrário, afirmando que a porta sempre estivera aberta, não podiam estar, ambos, certos. Um deles estava, com certeza, errado. Mas, não será possível um outro ponto de vista? Não será possível estar para além do "certo" e do "errado" e admitir que os dois pudessem ter razão?

      Rabiya tinha razão porque, de facto, a porta está e esteve sempre aberta. Mas Salih também tinha razão em querer que os seus discípulos não cessassem de bater à porta: É que o comum das pessoas não percebe que a "porta está e esteve sempre aberta". Por isso, precisam de bater muitas vezes à porta. Não para que a venham abrir, mas, para que, um dia, se possam aperceber de que a porta esteve sempre aberta. Então, talvez exclamem, surpreendidos: "Olha...afinal, a porta estava aberta! Porque estive eu, então, a bater, durante tantos anos, à porta? Bastava um simples empurrão...

    Cheguei agora ao ponto que pretendia: Haverá alguma relação entre Krishnamurti e aquilo que se acabou de dizer? Penso que sim. Por isso, cito uma afirmação por ele feita, numa das suas conferências, relativamente ao processo de busca da verdade: "Em geral, "buscamos", porque nos sentimos muito confusos. Mas com a mente nova, em cada instante, nunca estamos a buscar. A ideia de "buscar e achareis" é, para mim, totalmente absurda". E, mais adiante, numa referência à meditação, declara: "A meditação é importante, mas não o "como" meditar, não a prática da meditação, não a maneira de manter certas visões que são infantilidades que, infelizmente, foram exportadas do Oriente para o Ocidente."

    Pelo exposto, se vê que, tanto para Krishnamurti como para o mestre sufi Rabiya, é absurdo o processo de busca, que consiste em "bater a uma porta que está sempre aberta". Todas as técnicas, assim como a relação mestre-discípulo são inúteis para Krishnamurti. Mas, será mesmo assim em todas as circunstâncias? Porque razão Krishnamurti é hostil em relação às técnicas? É que condenar as técnicas também é uma técnica. Podemos chamar-lhe a "técnica da não-técnica". E Krishnamurti não foi o primeiro a usar esta técnica da "não-técnica". Bodhidharma, que introduziu o budismo Chan (ouZen) na China também a aplicou. Aliás, esta ausência de técnicas é uma característica do Zen. E Krishnamurti está muito próximo do Zen.

     Tudo o que Krishnamurti diz é estritamente verdade. Contudo, o que ele revela não é compreendido pela generalidade das pessoas que têm assistido às suas conferências, porque quem o quer ouvir vai à procura de uma resposta para as suas inquietações. Vai à procura de um "como". E essa resposta nunca é dada por Krishnamurti. Esse "como" é sempre recusado.

     Neste aspeto, Buda foi explícito: "Quando alguém quer atravessar um rio, serve-se de um barco. Mas, depois de chegar à outra margem, não vai andar com o barco às costas". Trata-se, evidentemente, de uma alegoria: O barco representa os meios, ou técnicas, de que nos servimos para alcançar a autorrealização. Mas, logo que esse objetivo é alcançado (a outra margem do rio), o barco (as técnicas) deixa de ser necessário. A diferença entre o ponto de vista de Buda e o de Krishnamurti consiste no facto do primeiro reconhecer a necessidade do "barco" antes de se alcançar a outra margem, enquanto Krishnamurti recusa, pura e simplesmente, a necessidade do "barco", em qualquer circunstância. Todos devem atravessar o rio a nado.

   Krishnamurti é, provavelmente, alguém que já está na outra margem. Alguém que fala a linguagem dos "despertos", mas que, talvez, não disponha, ou não queira dispor, de uma corda para puxar os outros. Ora, no estado em que se encontram a quase totalidade das pessoas, a "corda" é necessária, o "barco" é necessário, as técnicas são necessárias. É preciso portanto não cessar de "bater à porta", como disseram Salih e Jesus, para que, um dia, se possa perceber aquilo que Rabiya e Krishnamurti afirmaram, ainda que de modo diferente: A porta está e esteve sempre aberta.

in, José Flórido - TEXTOS ( http://joseflorido.weebly.com/textos )

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

DIA MUNDIAL DA LÍNGUA MATERNA - UM PATRIMÓNIO CULTURAL A DEFENDER


Em vez de português erudito fomenta-se o português macarrónico

António Justo

21 de Fevereiro é o Dia Internacional da Língua Materna. Foi proclamado pela UNESCO como memorial para "promover a diversidade e o multilinguismo linguística e cultural".

Segundo a UNESCO, metade das línguas maternas encontram-se em risco de desaparecer (entre elas o Bretão, Quechua e Nahuatl). Com a celebração do Dia da Língua materna, pretende-se manter viva  a consciência das tradições linguísticas e culturais. A visibilidade de um espaço cultural manifesta-se através da língua e suas marcas.

Especialmente nos países da lusofonia há que ter isto em consideração. A protecção dos falares indígenas e das tribos não deve porém substituir o português como língua de comunicação nacional e internacional. Seria relevante manter uma relação equilibrada entre os interesses regionais e o interesse da identidade nacional que se expressa numa língua de comunicação para todos. 


Fazer uma coisa não implica deixar de fazer a outra (Unum facere et alium non omittere). No contexto importa recordar o lema latino “E pluribus unum” (fazer de muitos um/unidade na diversidade); este lema fez dos EUA o país que é hoje. Sem integração não há unidade orgânica.

O idioma deve reflectir, pelo menos, nalguma das suas partes, a herança cultural do todo e do particular, como memória viva a gerar futuro.

Tanto uma olhadela sobre o Português, muitas vezes usado no dia-a-dia, como sobre a política da língua não permite grande satisfação a muitos os falantes lusófonos. Tem-se implementado o empobrecimento da língua com uma reforma ortográfica que na ortografia não favorece a especificação (exemplo: faz das palavras facto e fato uma só palavra (fato) para com um só vocábulo designar dois conceitos.

O “português do brasil” ou português de expressão brasileira tem-se afastado das línguas de origem latina europeia (contrariado o desenvolvimento diferenciador destas) ao reduzir o emprego das pessoas gramaticais (no sentido de uma indiferenciação e como tal empobrecedora).  As línguas europeias de origem latina mantêm o alto nível da língua na sua diferenciação preservando as três pessoas gramaticais do singular e do plural: eu, tu, ele-ela, (você, a gente) e nós, vós, eles-elas, (vocês) permanecendo fiéis à defesa da excelência da língua e contrariando a tendência simplicista de se cair no uso de uma língua de caracter “macarrónico” (substituir o uso da segunda pessoa gramatical pela terceira, etc.).

Por outro lado há demasiados anglicanismos bárbaros empregados no português sem o conveniente aportuguesamento.

Nos média sociais ( Facebook) espalha-se  paulatinamente uma comunicação abreviada e simplicista que, com o tempo, poderá levar muitos a não conseguir escrever uma carta em português correcto.
Do mesmo problema se queixam professores universitários que constatam em muitos alunos grandes défices na expressa do português.

No mercado observam-se também cadeias de empresas que não se preocupam em traduzir os nomes dos produtos para as  línguas onde são vendidos.

Na França implementaram-se medidas para defesa e enriquecimento da língua. Em 1994, na França foi proibido o uso de conceitos ingleses sem serem traduzidos. Cada conceito introduzido na língua materna que respeite o seu espírito constitui um enriquecimento da língua. (Confesso que por vezes uso estrangeirismos por não encontrar ainda termos adequados em Português).

A língua é um organismo vivo e como tal aberta ao novo, mas deve ser respeitada sem ser violada; naturalmente há também nichos usados por grupos étnicos, estudantes, estrangeiros, além de regionalismos, dialectos, etc.

Infelizmente o governo pretende diminuir o ensino da língua materna em favor de disciplinas sociais.

António da Cunha Duarte Justo

“Pegadas do Espírito no Tempo” http://antonio-justo.eu/?p=4146

(1)   Coloco aqui os links de alguns artigos que publiquei referentes ao assunto: Cometem-se barbaridades contra a língua portuguesa  numa tentativa populista de valorizar o analfabetismo: http://www.mundolusiada.com.br/artigos/barbaridades-contra-a-lingua-portuguesa/

Acordo ortográfico segue a via popular: http://antonio-justo.eu/?p=2190


MEC brasileiro pretende acabar com a obrigatoriedade da Literatura portuguesa: de Cavalo para Burro?: http://agostinhodasilva.blogtok.com/menu/6/42434/

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Uma sonda espacial norte-americana, dentro de algumas horas, cruzar-se-á com a cauda de um cometa, onde recolherá partículas que fará regressar à Terra por volta da Primavera de dois mil e seis.
Segundo os cientistas envolvidos, estes elementos possibilitarão o estabelecimento de novos dados que, eventualmente, trarão novos acréscimos para a compreensão da origem do sistema solar. 

É a Humanidade no seu melhor. 

E se da parte da sonda europeia que na passada semana atingiu a superfície marciana tudo parece ter sido em vão, amanhã será a vez de uma outra, desta vez norte-americana, tentar a sua sorte para dali enviar novas informações sobre aquele nosso vizinho. 

Oxalá tudo corra pelo melhor. 


O espaço é o prolongamento natural da nossa casa comum que é a Terra e, como tal, também ele é lugar de comunhão, sobre o qual os humanos deveriam pactuar em manter livre de armas e apenas sujeito às experiências exploratórias que interessem ao entendimento do Universo e de como a nossa espécie em ele se possa expandir e propagar, em busca da eternidade. 

Paralelamente a fenómenos como o holocausto nuclear ou a tomada de consciência a respeito do funcionamento do sistema atmosférico e da forma como certos problemas transcendem os possíveis impactos locais, o espaço cósmico é outra das realidades que nos leva a pensar no planeta como um todo e, portanto, na Humanidade como um conjunto de seres, até agora, confinados ao mesmo habitat. 
Na verdade, visto do exterior, o nosso planeta apresenta-se como um pequeno corpo envolvido numa bolha gasosa. Não se divisam as barreiras que os homens estabeleceram entre si. Sabe-se, isso sim que ali habitam seres vivos e que em face da imensidão fria e inóspita que nos separa das outras estrelas, é aquele um berlinde lindo e acolhedor que não podemos estragar, sob pena de nos perdermos para todo o sempre. 

A nossa naturalidade é a Terra e a nossa cidadania é planetária. 
A qualquer indivíduo devem ser reconhecidos os mesmos direitos dos nacionais seja qual for o país em que se encontre. 
É com base no desenvolvimento desta ideia que deveremos abordar problemas como, por exemplo, a imigração. 



Ora também a Matilde parece ter tido sorte com a Professora. 
Senhora experiente e sabedora dos segredos profissionais, tem conseguido transmitir os conhecimentos sem que a necessidade de disciplina para que tal aconteça tenha produzido o afastamento dos miúdos quanto à vontade de aprender. Pelo que observo com a minha querida filha e ainda pelo que ela me vai dizendo sobre o que acontece na sala de aula, é suficientemente firme para não permitir abusos mas, simultaneamente, tem a presença de espírito para conseguir cativar as crianças quer pela justeza dos julgamentos, quer ainda pelo carinho do acompanhamento que se revela no modo como os trata, bem como em pequenos gestos do género de os ter acompanhado ao parque infantil no dia do magusto; e a exigência que lhes faz quanto à limpeza do respectivo lugar, para além da sensatez, tem o condão de melhor distinguir o mérito que se tem que ter para ganhar a autorização de saída para o segundo intervalo. 
Não fosse isto importante, tudo indica que explica bem os assuntos e sabe dosear as solicitações de trabalhos caseiros de forma que, sem sobre-esforço algum, os alunos possam completar ou exercitar as matérias dadas. 
Como é efectiva na escola, é de esperar que acompanhe esta turma até à quarta classe o que, avaliando por aquilo que sucedeu com a Margarida, dá aos pais a segurança de poder contar com um trabalho continuado com os bons resultados que, normalmente, isso acarreta. 
Até ao momento, o balanço não poderia ser melhor. 



E o Sol destes dias que aqueceu o ar e o chão que logo fez colorir de alegria. 
Esta manhã, no caminho para a aula de natação, o pai e as filhas foram comentando o quanto os campos estão bonitos. 


E o resto que nos separou do almoço fez-se de Amartya Sen de cujo livro registo agora uma nota que tirei há já alguns dias. 
Tomem a devida atenção. 
“(…) A democracia não funciona como um remédio automático para as maleitas, como o quinino para a malária. As oportunidades que abre têm que ser agarradas a fim de se obter o fim desejado. E isso é, evidentemente, obra das liberdades em geral – muito depende de como as liberdades são efectivamente exercidas.” (1) 



Esta tarde, enquanto a mãe e as filhas foram passear de bicicleta, acabando com um lanche em casa dos avós, eu fiquei em casa a arrumar o escritório que, depois da fadiga consumada, já não parece o mesmo. 

Mas devo reconhecer que gosto mais assim. A verdade é que já estava a ficar atulhado em pilhas de livros e papeis sobre a secretária. 


Seja como for, salvou-se a música e eu dei comigo a manter uma opinião de miúdo. O “Close to the Edge”, dos Yes, é a obra-prima daquilo que ficou conhecido por rock sinfónico. 


Alhos Vedros 
  03/01/2004 


NOTA 

(1) Sen, Amartya, O DESENVOLVIMENTO COMO LIBERDADE, p. 168 


CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA 

Sen, Amartya, O DESENVOLVIMENTO COMO LIBERDADE, Prefácio do Autor, Tradução de Joaquim Coelho Rosa, Gradiva (1ª. Edição), Lisboa, 2003

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

REAL... IRREAL... SURREAL... (243)


A Viagem na Minha Terra I
Guilherme Parente
Dimensões 162 x 200 cm

Viagem

É o vento que me leva. 
O vento lusitano. 
É este sopro humano 
Universal 
Que enfuna a inquietação de Portugal. 
É esta fúria de loucura mansa 
Que tudo alcança 
Sem alcançar. 
Que vai de céu em céu, 
De mar em mar, 
Até nunca chegar. 
E esta tentação de me encontrar 
Mais rico de amargura 
Nas pausas da ventura 
De me procurar...


Miguel Torga


Selecção de António Tapadinhas

sábado, 18 de fevereiro de 2017

Duetos Luso-Brasileiros



Mimo de Vênus 
Meditando e colhendo hibiscos


Composição fotográfica e título de Kity Amaral
Legenda de Luís Santos


Um novo clarão na escuridão
o abraço de Vénus que me espera
por detrás da janela dela

seta que atravessa a noite
brilho do sol, da luz
da cristiana paisagem em que medito

do êxtase oriental em que me deito
dos mimos, da infinita beleza da cor
dos mamilos, do órgão sexual da flor



quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Poemas com Jazz



Gato de Sala

Se sentou á mesa o gato, 
A torradeira estalou a compasso 
E o gato ronronou a vozes mansas,
Da mesa descendo e pelo chão caminhava 
Em direcção á porta.

Queimadas as torradas,
Traçadas a fogo puro de tão negras
Como a noite agora vê o gato sentado
No sofá junto á lareira.

Uma fagulha saltou ao tapete,
O gato permaneceu imóvel no seu sonho
Estendido ao comprido no sofá pelo cheiro 
Queimado que da cozinha flutua.

O relógio bate meia-noite e a sala vibra 
Na altura máxima das estrelas.
É de noite e a vida compõe o esqueleto 
Que sustenta o sonho do gato.



Notem bem: Cliquem no nome do poeta que dá jazz, e muitoooo boommm!


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Erva-príncipe


por Miguel Boieiro




Amigo de longa data, também fã das PAM (para quem ainda não sabe: Plantas Aromáticas e Medicinais), trouxe-me de França um frasco de essência de “citronnelle”. Encimando o recipiente há um pavio que, ao acender-se, liberta uma fumaça perfumada que tem o condão de afugentar as arreliadoras melgas. Tenho experimentado e posso afirmar que resulta mesmo!

A referida essência é extraída da erva-príncipe que os franceses designam por “citronnelle” e os ingleses por “lemongrass”, pelo seu agradável odor a limão. Para que não restem dúvidas sobre que planta se trata, adito a sua nomenclatura científica: Cymbopogon citratus.

Julga-se que teve a sua origem no sul da Ásia e é muito utilizada na Índia, Sri Lanka, Tailândia, Malásia, Indonésia, etc., como planta medicinal, gastronómica e condimentar.

Os livros antigos de fitoterapia que consulto habitualmente nunca referem esta erva, pois ela não se encontrava ainda suficientemente divulgada no continente europeu. Todavia, no “Asian Herbs Vegetables” de Penny Woodward que adquiri há tempos, em Melbourne, a Cymbopogon tem honras de capítulo.

A erva-príncipe pertence à família das Poáceas que, sendo oriunda dos climas tropicais, também se dá razoavelmente bem nos climas atlântico-mediterrânicos. Apenas dois cuidados devemos ter: evitar as geadas no inverno e regá-la regularmente no verão.

Como a maior parte das poáceas, possui folhas lineares alongadas e lanceoladas em forma de lâmina. As margens das folhas são ásperas e cortantes (eu que o diga, pois várias vezes me feri nas mãos, ao colher despreocupadamente as citadas folhas para confecionar um chazinho). A base da folhagem é constituída por estolhos (rizomas), donde, todos os anos, brotam novos rebentos. Por isso se considera uma planta estolonífera (aprendam mais este vocábulo!) e perene. Dizem alguns documentos específicos que ela desabrocha flores que se reúnem em espigas de 30 a 60 cm de dimensão, formando racimos. Tal asserção não a posso confirmar porque nunca vi uma erva-príncipe florida. A própria Penny Woodward diz, na obra atrás referida, que a planta raramente floresce. É portanto um quase perfeito exemplo de reprodução por clonagem.

O constituinte principal da erva-príncipe é um óleo essencial denominado citral que, no tempo seco pode chegar a 60% da massa vegetal. Este óleo está também presente na casca dos citrinos e ajuda a sintetizar a vitamina A no organismo humano, sendo amplamente utilizado em perfumaria. Embora em muito menor quantidade, a planta contém outros óleos como o geranol, o linalol e o nerol e ainda aldeídos, cetonas, ácidos e ésteres vários.

Para que serve a erva-príncipe? Para além de repelir os insetos, como acima aludimos, ela é uma excelente planta medicinal. Destacam-se algumas das suas propriedades: analgésica, antidepressiva, antibacteriana, antidiarreica, bactericida, carminativa, digestiva, diurética, sudorífera, sedativa, vasodilatadora…

Está indicada para digestões difíceis, ansiedade, insónia, diarreia, flatulências, acnes, celulites, limpeza de peles oleosas, mediante infusões, decocções e cataplasmas das folhas e dos rizomas (uso externo). Habitualmente, prefiro-a como tisana digestiva para tomar a seguir aos repastos: três ou quatro colheres bem cheias de folhas frescas finamente cortadas (atenção: sempre folhas verdes e não secas) para um litro de água, ficando em infusão durante, pelo menos, 10 minutos. O seu sabor é agradabilíssimo.

Na Índia, a erva-príncipe entra em numerosas aplicações de medicina ayurvédica.

Finalmente (“last, but not least”) há que referir a utilização desta planta na cozinha oriental, constituindo um dos principais ingredientes, quer como condimento, quer como legume cozinhado. As partes mais tenras das folhas podem ser integradas em marinadas e assados. Anote-se que, na confeção de “curries” (molhos), a erva-príncipe casa muito bem com o gengibre, o coco, o alho e os diversos tipos de pimento.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

HÁ GUERRA NAS ESTRADAS

Eu bem que gostaria de ter coisas mais edificantes para escrever mas, infelizmente, para lá do sossego do lar, no seu início, o novo ano parece tão sombrio quanto o anterior o foi a terminar. O mundo não está muito animador. 

No Iraque continuam as emboscadas sobre as tropas aliadas e ao invés de cerrarem fileiras para imporem um convívio pacífico entre as nações, os países ocidentais parecem apostados em permitir que o terror divida e, com isso, os impeça de enfrentar e controlar os lóbis que têm interesse na insegurança e na miséria que tantas vezes são usadas para justificarem tiranias da pior espécie e que, por sua vez e por um efeito de círculo vicioso, acabam por gerar mais injustiça e a pobreza que a ela sempre vem agarrada. 

Não compreendo como é que as vozes dos democratas não exigem a democracia à escala planetária, contudo, tenho a certeza que só pela partilha desse estado de vivência social poderão os humanos almejar a paz que tão imprescindível é à sobrevivência da espécie. 


E até a Terra parece assustada que depois do Irão, foi a vez de Bali, na Indonésia, sentir um sismo de intensidade de seis vírgula três na escala de Richter. 



Mas o dia de hoje esteve tão bonito que, ao mesmo tempo que mais nos faz deplorar esta nossa história trágica, também nos lembra que, apesar de tudo, o paraíso está aqui, bem ao alcance do nosso bom senso e inteligência. 



Aqui por casa o dia foi dedicado a arrumações dos livros e das tralhas do piolhito e do pardalito que ajudaram a mãe a colocar as coisas no devido lugar. 



E Portugal não poderia ter começado o ano da pior maneira. 
Só nas primeiras vinte e quatro horas faleceram cinco pessoas em acidentes de viação, todos fruto da incivilidade de condutores alcoolizados e em excesso de velocidade. 

Pior que isto só a guerra desencadeada sobre a justiça para que o processo casa pia venha a parir o rato de uma pena que deixe de fora tudo quanto é nome com dinheiro suficiente para fazer parar a produção de provas incriminatórias. 
Cheira a fp que tresanda e a ver vamos se aqueles que colaboraram com a acusação não sairão os únicos condenados. 

Entrámos no plano inclinado em direcção ao Brasil. 


 Alhos Vedros 
   02/01/2004

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

REAL... IRREAL... SURREAL... (242)


Desenho de Pedro Sousa Pereira

Ode Triunfal

Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime! 
Ser completo como uma máquina! 
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo! 
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto, 
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento 
A todos os perfumes de óleos e calores e carvões 
Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!

Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)


Selecção de António Tapadinhas

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Manuel (D'Angola) de Sousa - Poemas


1.

“Crianças De Silencioso Nu Dos Becos E Ruas De Fachadas e Perfis Doirados”

Alguns olhos são janelas abertas e claras e outros são poços escuros e abismais
Uns são ainda profundos e brilhantes e há-os vítreos e superficiais ou ôcos
Olham para si e para as proximidades de si mesmos e de suas imagens únicas
Existem aqueles que mergulham em tudo e vêem à lupa e em detalhe ao longe
Há os que perscrutam além dos espelhos de água ou de vidro no interior de outrem

Imagino-me ovo de dinossauro e em simultâneo nos torreões das igrejas antigas
Passa alguém apressado com uma bíblia e ares africanos nas mãos universais
Tudo lá fora parece alinhado com miríades de mentes fechadas e ilegíveis
Pouco ou nada transparece perdido contudo no fundo dos peitos opacos
Nem tão pouco se chega a notar a inocência da distante aparência ingénua

Abunda ainda a bondade do silêncio e alguma dúvida no visível sub-abstracto
A gentileza mistura-se com a pouca vontade de cumprimentar desconhecidos
Crianças carregando paus e energia fazem a diferença e pulam indiferentes
Só sentem quem os observa de perto e quase nunca a quem o faz de passagem
Se pressentem ou não o que vai ao longe não o deixam transparecer facilmente

Pombos e corvos negros e outros pássaros pretos esvoaçam nostalgicamente
O tempo transcorre mágico e com o conteúdo humano e de betão dentro de si
Tudo parece ser deveras breve e um turbilhão finito e tão intemporal também
Na mesma ocasião estou em simultâneo dentro e fora das montras de Bruxelas
Casais agarram-se e abraçam-se temporariamente felizes em ternura repentina

Serpentinas de cerveja há-as por todo o lado e a cada esquina e em cada bar
Resplandecente riqueza imensa que emite exotismos tais em todos os ângulos
Cosmopolitanos sorrisos e caras de meios e orientes completos misturam-se
Amontoados de casas e habitáculos com ar medieval ocultam quem não conheço
Ando incógnito por entre florestas de faces várias e obstáculos fixos e móveis

Odores e cheiros de comidas tradicionais e típicas diversas invadem-me as narinas
Há Hábitos e costumes numa autêntica caldeirada de mil e tantos sabores excêntricos
Atropelos involuntários e ou despropositados abalroam aqueles de valor Europeu
No mesmo instante é-o salutar e também não o é adequado ou oportuno por vezes
Por entre uma salganhada de semblantes tristes e soturnos revê-se o agora e o talvez

Sobe-se e desce-se e curva-se e contra-curva-se a apreciar-se miríades de detalhes
Talvez o nada não me aborreça e tão pouco me entorpece a vista ou facialmente
Descrevo ainda um languido gato a esparramar-se preguiçosamente numa vitrina
Aparecem-me pelo meio de tanta coisa uma série de jardins anões engarrafados
Sinto-me eu próprio num autêntico oceano de múltiplos edens de espíritos e almas

Dobro a arquitectura característica à medida que me movo tranquilamente elástico
Abro amplamente a terceira visão e o poder para intuir através de lentes artificiais
Incorporo a cidade num extraordinário senso de equilíbrio meditativo existencial
Sorvo o que vejo num impressionante todo que mal me cabe na barriga mental
Encho a psique superficial e subconsciente de praças icónicas pontilhadas a ouro…

Pinto concêntricos perfis com a câmera do telefone e desço o pano sobre o cenário final…

Escrito no comboio entre Antuérpia e Bruxelas e a caminhar nas ruas desta ultima Cidade, tida como Capital da União Europeia e da Bélgica bilingue, por Manuel (D’Angola) de Sousa, a 5 de Fevereiro de 2017, em Homenagem ao Povo Belga e às cosmopolitas Cidades de Bruxelas e Antuérpia e aos respectivos Cidadãos de ambas, Belgas e outros Europeus ou da panóplia de outras Nacionalidades que nelas residem e trabalham, contribuindo assim ou não para renda das duas…


2.

“Humanas Jóias De Luz E Do Universo E De Toda A Criação Cósmicos”

Deixem-me estar aqui sossegado neste canto e não me incomodem
Não joguem corda nenhuma para me socorrer porque estou bem
Preciso que me levem às portas do Paraíso e lá me deixem ao portão
E nem pensem que preciso de cunhas ou quaisquer alcunhas que sejam
Tirem-me da frente tão simplesmente os entraves artificiais e administrativos
A Humanidade precisa é de liberdade de pensamento e de direito à educação
Todos formados protegemo-nos-emos e promovemo-no-emos uns aos outros

Seremos mais sólidos e defensores da democracia e do liberalismo pleno
Procuraremos o desenvolvimento constante sem outros requisitos ou intervenções
Há que ter em consideração que perante a constituição e a lei somos todos iguais
Todos temos direitos e necessidades equivalentes e semelhantes prescritos
Vamos dar mãos e unir a inteligência e esforços no sentido de sermos perceptivos
Aceitemos outras ideias e todas as críticas que sejam construtivas e benéficas
Caminhemos lado a lado num mesmo percurso e nossos corações serão receptivos

Restrições e contracções a mais e forçadas e artificiais não levam a lado nenhum
Deixemos de lado rancores e ódios que só nos cegam e levam à brutalidade monstra
Olhemo-nos nos olhos uns dos outros e façamo-lo com a maior compaixão possível
Amemos nossos reflexos e todos os que connosco partilham o oxigénio matinal
Ombreemos no mesmo esforço comum e elevemos nossas almas ao êxito e ao sucesso
Façamos de nossas ilusões e sonhos algo concreto e real e edifiquemos os espíritos
Levantemos os olhares para os Céus Interiores e abracemo-nos todos num abraço Universal…

Escrito por Manuel (D’Angola) de Sousa, a 5 de Fevereiro, em Antuérpia, em Homenagem ao Universo e à Alma Cósmica e aos Seres Humanos e de todos os Planetas onde a Sagrada e Mágica Vida se manifesta

As almas são autênticos brilhantes reluzentes na noite e que juntam seus raios de luz à luz das Estrelas e que, com elas, levam a luz aos Corações e a todo o Universo Cósmico…

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Navegar é preciso, Viver não é preciso





Estava lá tudo e era a hora
luz do sol puríssima
o primeiro europeu, e eu, na américa

e parvos que levavam escravos
música e esperança,
belo horizonte

da terra se diz mar à vista
e muito bela uma Índia
que me conquista


(Fotografia de Kity Amaral
legenda de Luís Santos)




terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

FELIZ ANO NOVO!

Neste Portugal a fazer o pino 
tivemos saleiros e murteirada 
agora temos o senhor Isaltino 
com casas de obra aldrabada. 



E assim vai a educação. 
O Director-Geral da Região Centro foi demitido na sequência de colocações indevidas e de favorecimento de alguns professores. 



E não é que na Sérvia os nacionalistas estão em grande força na corrida eleitoral? 
Milosevic é o candidato proposto do seu partido. 



A paternidade é uma função de alegria, por muitos que sejam os cadilhos que atrapalhem o decurso dos dias. 
É tão reconfortante quando a família está junta e nós podemos acompanhar o crescer, partilhar o júbilo de ver o avolumar do conhecimento e da experiência e as capacidades aumentarem na direcção da autonomia pessoal. 
Há o cansaço, naturalmente e tantas vezes a vontade de evasão e muitas são as ocasiões em que o corpo e o espírito reclamam a prioridade do descanso. Mas os momentos de encanto que os laços de amor transportam, se os deixarmos fazer efeito, acabam por se sobrepor a tudo o que de negativo nos possa entristecer. 
Além disso está a consciência que nos faz compreender o quanto é importante para os mais novos que os pais estejam presentes e saibam muito simplesmente ouvir e incentivar. É bom que as crianças sintam que podem responder aos desafios com confiança e aí entra o tal apoio comedido de que falei. São muitas as desgraças que se previnem por este meio. Não estou com isto a sustentar que estes miúdos não venham a perder-se na vida pois, como sabemos, no que se refere à humana personalidade não há combinações mecânicas de causa e efeito. A realidade é muito mais complexa do que isso. No entanto, não tenho dúvidas que o carinho e a atenção que dispensamos aos filhos os ajuda no despontar da auto-estima e auto-confiança que são os melhores preventivos para os maus caminhos que arrepiam os objectivos de uma vida digna e socialmente produtiva. 
Daí que esteja convencido que mesmo quando temos a certeza de estarmos a praticar um sobre-esforço – creio sinceramente que a palavra sacrifício seria aqui abusiva – devemos procurar manter a serenidade que permita às flores suplantarem os tons mais escurecidos do horizonte. 
Por muito que a paternidade nos esgote, temos sempre forma de retemperar as forças e no fim temos a leveza da alma que nos traz sempre prontos a enfrentar os escolhos, por mais espinhosos que sejam.



E a luz, a luz do Inverno que provoca crepúsculos tão coloridos. 

Já se vai notando a diferença na duração dos dias. 



A Margarida é engraçada. Já leu os livros que as irmãs receberam como prendas deste Natal. Mas dá preferência àqueles que tratam assuntos da realidade envolvente. 
E nestes dias tem andado a ler em voz alta para que a Matilde ouça e depois possa resolver as perguntas que, a propósito, a mais velha lhe apresenta. 
Curiosamente, tanto uma como a outra gostam muito dos temas relacionados com o corpo humano. 



E agora termino. Faremos o jantar de fim de ano em casa do João e da Teresa. 



Votos de Ano Novo próspero e em paz para todos. 


 Alhos Vedros 
   31/12/2003

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

REAL... IRREAL... SURREAL... (241)

Centro Comercial, António Tapadinhas, 2012
Acrílico sobre Tela, 80x100 cm

O Vendedor

na montra dos brinquedos
há um comboio à andar
mecanismos e segredos
fazem bonecos falar
na montra dos brinquedos
há meninos a olhar
roendo as unhas dos dedos
por não lhes poder tocar
e lá dentro há outros dedos
tão cansados de embrulhar
de por fitas nos brinquedos
para quem os pode comprar
os vendedores de presentes
não têm mãos a medir
ficam com as mãos dormentes
enquanto há mãos a pedir
índios e soldados
carrinhos de corda
um tambor e um balão
jogos engraçados
e a cara gorda
de um boneco em papelão
quem sabe fazê-los,
quem sabe vendê-los,
tem sempre o Natal à mão
mas a mão a que embrulha
a mão que trabalha
tem sempre o seu ganha pão
quem faz e vende brinquedos
inventa um mundo real
tem o trabalho, os segredos
que foram do Pai Natal
O Pai Natal de hoje em dia
não tem dia não tem barbas nem sacola
dá mãos cheias de alegria
dá ternura, não dá esmola.

José Carlos Ary dos Santos


Selecção de António Tapadinhas