segunda-feira, 30 de novembro de 2015

REAL... IRREAL... SURREAL... (160)

The Ten Cent Breakfast, Willard Metcalf, 1887
Óleo sobre Tela, 38,7 x 55,9cm 

" OS AMIGOS "

Amigos, cento e dez, e talvez mais,
Eu já contei. Vaidades que eu sentia:
Supus que sobre a terra não havia
Mais ditoso mortal entre os mortais!

Amigos, cento e dez! Tão serviçais,
Tão zelosos das leis da cortesia
Que, já farto de os ver, me escapulia
Às suas curvaturas vertebrais.

Um dia adoeci profundamente. Ceguei.
Dos cento e dez houve um somente
Que não desfez os laços quasi rotos.

Que vamos nós (diziam) lá fazer?
Se ele está cego não nos pode ver.
- Que cento e nove impávidos marotos!


Camilo Castelo Branco

domingo, 29 de novembro de 2015

 
 
MIRADOURO 39 / 2015
esta rubrica não respeita as normas do acordo ortográfico



(foto de Edgar Cantante)
 
 
Agora é o agora e o agora é o já.
De modo que o amanhã é, de facto, longe de mais.
Daí o exercício necessário.
Daí o tear dos fios da vida.
Os nós e os laços.
O querer e não poder.
O poder mas não querer.
O adiar.
Adiar, que não esquecer.
*
Ao ver o frenesim das pessoas a sair do barco em hora “de ponta” uma criança perguntava a outra:
«já reparaste que só com dois olhos conseguimos ver tudo isto?»
e a outra criança sorriu, sorria.
Não disse, mas pensava:
«E com um só coração conseguimos sentir tudo. O que vemos, o que percebemos e o que pressentimos.»
Não falou do que percebeu nem do que pressentiu porque o fim da tarde estava lindo, a temperatura amena, a cumplicidade apetecia e por haver coisas difíceis de explicar.
*
Porquê a lembrança destas crianças agora ?
A mecânica não se revela mas a memória não se coíbe.
Mesmo sem saber, sei.
O regresso à infância recompõe o território das possibilidades.
Ou atascamos no lodo do que nos prende(u), ou voamos em renovados céus  do que sonhámos, do que sonhamos.   
*
Se o hoje é pardo e incerto e o ontem é o de onde vimos e sem regresso, é no agora que se faz amanhã, mesmo que se longe de mais, que tudo se joga  e é por isso mesmo que é para lá que vamos.
E somos.
 
Manuel João Croca
 
 

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

L U Z


Um único fósforo aceso
pode incendiar
uma vasta floresta
torna-te aquilo
que já És em essência,
Luz,

e poderás contagiar
e Iluminar
uma vasta multidão


António Alfacinha



quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Vai um cafezinho?





Quem, senão nós?
Quando, senão agora?
Onde, senão aqui?


Foto de Lucas Rosa


(Na foto, Diogo Correia, poeta, músico, artista de variedades.)

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Amor ao Fado


Partilho com todos vós este meu suave poema declamado
que poderão ver e ouvir em Poema da Semana neste link:




terça-feira, 24 de novembro de 2015

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

CHOVE EM BAGDAD

Ena pá, a Matilde teve um Domingo de galderice. 
Saiu de manhã para a primeira aula de catequese a que se seguiu a presença na missa, tendo então recebido o convite para almoçar em casa dos avós da sua amiga Joana Alves que, segundo a mãe, foi prontamente aceite. 
Para além da brincadeira, claro está, faz parte do pacote uma ida ao circo. 

E agora que na tarde os pássaros regressam ao lar, ela ainda não voltou. 
Rica vida, a do pardalito. 



Ao dia de ontem seguiu-se a luz do Sol. 

Enquanto fumei um cigarro à varanda, foi bonito de ver as velas, ao longe, evoluindo no estuário. 



Pois em Bagdad, as forças das trevas continuam a fazer ouvir os sons do terror. 
Mais um carro armadilhado, desta vez, tendo por alvo o Hotel Bagdad, o quartel-general da CIA naquela cidade. Uma dezena de mortos entre polícias e iraquianos e outros tantos feridos. 
As forças aliadas não enfrentam apenas os acólitos do antigo regime de Saddam Hussein. Tal como escrevi em Abril, o Iraque é o actual campo de batalha da guerra mais vasta contra o terrorismo internacional. (1) 
Ali já deixou de estar apenas em jogo a paz mundial; pelo confronto directo que lá acontece, neste momento, com a Al-Qaeda e afins, está igualmente em causa a vida, tal como a conhecemos, neste planeta. Aquela gente não se deterá em face do apocalipse. 
Referindo-se a essa constelação, faço minhas as palavras do Mestre Vargas Llosa que passo a citar:
“(…) Todos eles – uns poucos milhares de fanáticos armados, isso sim, com extraordinários meios de destruição – sabem que se o Iraque chegar a ser uma democracia moderna, os seus dias estão contados e por isso desencadearam essa guerra sem quartel, não contra a ONU ou os soldados da coligação, mas sim contra o maltratado povo iraquiano. Deixar-lhes o terreno livre, seria condenar este povo a novas décadas de ignomínia e ditadura semelhantes às que padeceram sobre a autoridade do Baas. Na verdade, perante este crime e os que virão – agora está claro que as organizações humanitárias e de serviço civil passaram a ser objectivos militares do terror – a resposta da comunidade de países democráticos deveria ser multiplicar a ajuda e o apoio à reconstrução e democratização do Iraque. Porque neste país está-se a travar actualmente uma batalha cujo desenlace transcende as fronteiras iraquianas e do Médio Oriente, e abarca o vasto domínio dessa civilização pela qual sacrificaram as suas vidas Sérgio Vieira de Mello, o comandante da marinha Manuel Martin Oar, Nadia Younes e tantos heróis anónimos.” (2) 



Sinal de alegria e esperança. 
Até ao momento foi bem sucedida a separação de dois siameses egípcios que estavam unidos pelas cabeças. 
A operação teve lugar nos Estados Unidos da América e foi levada a cabo por cirurgiões daquele país e alguns colegas compatriotas dos bebés pacientes. 

Valorizamos tão pouco esta nossa faceta de animais capazes de criarem o belo. 


Entre nós, investigadores da Fundação Calouste Gulbenkian descobriram uma nova fórmula para prevenir e curar a malária. 



Assim quisessem os homens 
o paraíso 

neste grãozinho perdido 
na imensidão do cosmos. 



Michael Schumacher sagrou-se campeão mundial pela sexta vez, com isso batendo o recorde cinquentenário de Juan Manuel Fângio que se cifrava nas cinco vitórias. 

Entre os que permanecem no activo, ele é, provavelmente, a primeira figura desportiva a nível mundial. 



Ah! Esqueci-me de registar. 
Arnold Shwarzeneger foi eleito Governador, na Califórnia. 

Só pode ser grande uma nação em que um imigrante, décadas depois, chega a tão elevado cargo. 



Agora que já jantámos, a Margarida lê uma história para a mãe e a irmã. 
Assim se faz a felicidade antes dos pardalitos se entregarem aos lençóis o que acontecerá daqui a pouco. 


Alhos Vedros 
   12/10/2003 


NOTAS 

(1) Gomes, Luís F. de A., A ESPADA E O BURACO NEGRO, pp. 103/104 
(2)Vargas Llosa, Mário, COM AS BOTAS CALÇADAS, p. 35 


CITAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS 


Gomes, Luís F. de A., A ESPADA E O BURACO NEGRO, Nota de Abertura do Autor, Dactilografado, Alhos Vedros, 2003 
Vargas Llosa, Mário, COM AS BOTAS CALÇADAS, DN8, nº. 358, In “Diário de Notícias”, nº. 49142, de 11/120/2003

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

REAL... IRREAL... SURREAL... (159)

El Balandrito, Sorolla, 1909
Óleo sobre Tela, 100x110cm

A PONTE É O FIM
mudo calado
diz que és gente
silhueta
vestido de nu
olhos fixos
pedras argolas
estrada de água
escolhos e uma calçada
o vento
cruza-se no ar e nas margens
vences a exaustão
os olhos fitam o silêncio
o destino é o limite 
a ponte é o fim

Carlos Fernando Bondoso

Selecção de António Tapadinhas

domingo, 22 de novembro de 2015


MIRADOURO 38 / 2015
esta rubrica não respeita as normas do acordo ortográfico



INTER-RELAÇÕES
pessoas, objectos, animais.
cheiros, cores, sinais e
outras coisas mais.

º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º º
Há o que apesar das qualidades se rejeita.
Há o que apesar dos defeitos se abraça.
E há o resto todo, todo o resto, que nem sequer se avalia.
Porque não se sabe, não se conhece, não importa.
No interpretar da realidade que se concretiza nem tudo é racional.
Nem tudo é pensado, nem tudo é pesado, nem tudo é filtrado.
Não! há a química que sem ela nada existia,
a energia trocada que se não pode evitar.
Não se pode mesmo!
E então, sendo “apenas” energia/sensação
entra inteirinha na equação e joga no resultado da relação.
Consegue-se entender ou exige-se que contem para se poder concordar ou não?
Talvez que não seja possível contar.
Talvez haja algo que mesmo que se “saiba” não tem explicação.
Talvez assim tenha de bastar.
Estará, pois, certo assim.
E é assim que vai continuar porque é assim que as coisas são.
Por um pouco que se conhece,
um imenso desconhecido que hoje é escuro e só amanhã, talvez, claridão.


Manuel João Croca


(foto copiada da net e que não consigo identificar o Autor) 

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Etnografar a Arte de Rua (XV) Graffitar a Literatura



Graffiti fotografado por Luís Souta, 2015.
Alameda dos Combatentes da Grande Guerra, nº 113Cascais


«O viajante reconhece o pouco que é seu,
descobrindo o muito que não teve e o que nunca terá»
(Italo Calvino, As Cidades Invisíveis, 1972: 29)


Mais uma porta do crew Altura, pintada no Muraliza 2015. Mais uma criação artística que nos recorda um lendário viajante – Marco Pólo (1254-1324), um livro encantador – As Cidades Invisíveis (1972) e um grande intelectual – Italo Calvino (1923-1985).

As Cidades Invisíveis, que recebeu o prestigiado Prémio Felrinelli, assenta num longo diálogo imaginário entre o veneziano Marco Pólo e o imperador mongol Kublai Khan, neto de Gengis Khan. Italo Calvino num outro livro (obra póstuma de 1992, organizada por sua mulher Esther, que redigiu também o texto introdutório), Seis propostas para o próximo milénio (Lições americanas), no 3º capítulo (Exactidão, pp. 89-91), fala-nos deles (o livro e a natureza dúplice desses diálogos): «o livro em que creio que disse mais coisas continua a ser As Cidades Invisíveis, porque consegui concentrar num único símbolo todas as minhas reflexões, experiências e conjecturas; e também porque construí uma estrutura multifacetada em que cada texto curto está próximo dos outros numa sucessão que não implica uma consequencialidade ou uma hierarquia, mas sim uma rede dentro da qual se poderão traçar múltiplos percursos e extrair conclusões plurais e ramificadas.»

Italo é «mais um escritor de short stories do que de romances» (como o reconhece em Lições americanas, p. 165). Também por isso o adoro ler. Textos curtos de uma síntese densa, a «escrita breve» que, no deleite da leitura, nos desinquieta, nos obriga a pensar… e a agir.

Italo Calvino, um dos maiores escritores italianos, nascido e casado em Cuba, conviveu de perto com outros vultos do século XX: Cesare Pavese, Elio Vittorini, Roland Barthes, Claude Lévi-Strauss, Jorge Luís Borges, Che Guevara… Com eles partilhou o amor à literatura, as cumplicidades do neo-realismo, a indomável vontade de resistência aos totalitarismos. Italo «o escritor dos destinos cruzados» (título de um trabalho jornalístico de Fernanda Pratas, para a revista Xis - Público, secção “Mulheres e Homens”, pp. 42-5) confessa: «Tendo vivido em tempos de ditadura, e tendo sido apanhado por uma guerra total (…) ainda tenho a noção de que viver em paz e liberdade é um tipo de felicidade muito frágil, que me pode ser roubado a qualquer momento.»

Não será igualmente assim que nos sentimos, nestes dias conturbados pela violência terrorista internacional do Daesh?

Luís Souta

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Pedro Du Bois: Três Poemas



Último Livro de Pedro Du Bois


ALVOS

almejo a vida: alvejo
                       a caça

descanso sob a árvore
a ser derrubada

no ar a sensação
da perda

          apedrejo a vidraça
          e em cacos
          reflito
          ao dia: vida
                     condensada
                     em alvos
                     inatingíveis.
 



VIVER

Acordado.
Assustado.
Condenado: o barulho
                     nos aparelhos
                             (a eletricidade
                              é fonte: enérgica
                              mão sobre o rosto).

Revejo o instante em que
a metafísica se faz corpo e mente.

Aparelhos circunscritos
em órgãos no funcionamento
                   do entrelaçamento
                   entre vida
                   e morte.
 



PASSOS

Falo de passos cadenciados
na dança. Dos pares.
                 Digo do peso
                 das botas
                 desfilando
                 forças.

Evito a leveza em sapatilhas
de pés deformados na graça
entranhada em dores e saltos.

                  Conservo a imagem
                  singela da mulher
                  se fazendo eterna:
                              o descompasso
                              como tema.
 
(Pedro Du Bois, inéditos)

terça-feira, 17 de novembro de 2015

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Pois as tardes de chuva também têm os seus encantos. 

E agora no que resta da claridade, há manchas de azul rosado que as nuvens rolantes abrem, por cima das árvores, ainda verdes. 



Sem escolha prévia, esta manhã, ao sair para a aula de natação da pardalada, levei um dos abecedários que o “Público” divulgou, neste caso o que tem a década de trinta do século passado por mote. 
Leitura interessante que acabei enquanto esperava o corte de cabelo, a meio da tarde. 
Melhor seria titular o mesmo sobre a arte dos anos trinta pois é esse, grosso modo, o objecto do volume. (1) De qualquer forma, mais uma vez ali vemos o decénio em que os totalitarismos competiram, entre si, para ganharem a batalha do convencimento das populações, coisa que nos deveria fazer pensar nos tempos que correm, em que a civilização democrática sofre ataques de todos os lados. Fica bem claro, neste livrinho despretensioso mas tão cheio de informação precisa e acessível que a derrota da democracia não implica a vitória de um mundo melhor, mas sim a organização autoritária e totalitária da vida de cada dia. 



Faz todo o sentido que partamos do mesmo pressuposto de Tocqueville que identificou a democracia como o oposto da aristocracia, (2) para dessa forma isolarmos um sistema de referência que se constitui pelo modo de organização política de um estado e da sociedade que lhe corresponde, permitindo-nos compreender que um tal regime político acaba por se articular com um sistema social com a mesma certeza que, pelo modo de vida e as expressões materiais e espirituais da respetiva cultura, confluem para dar corpo a uma civilização democrática. 

O que surgiu primeiro, a democracia política ou a sociedade democrática? Como é que se implicam entre si? 
Se bem que considerando conceitos que se corporizam em realidades heterogéneas e, quando traduzidos em representações teóricas, necessariamente se estabelecendo em convenções sobre a realidade, estas perguntas são, precisamente, um bom ponto de partida para percebermos tanto aquelas noções como os universos concretos que reflectem e ainda como os mesmos se foram construindo ao longo dos séculos e pela combinação de contributos díspares quer no tempo como no espaço e tantas vezes tendo lugar em patamares que não estritamente os de ordem política. 

Creio que resolvidos estes problemas será mais fácil estabelecermos o que entendemos por democracia ou, se quisermos, para registarmos aquilo que podemos entender por regime democrático.
Ora este começa por ser aquele que assenta por um lado na separação dos poderes e, por outro, na livre escolha dos cidadãos. 
A separação dos poderes expressa-se desde logo na mútua independência entre os poderes político e judicial; o primeiro elabora e aprova as leis que o segundo supervisiona e aplica. Mas também na multiplicação e recíproco controle desses mesmos centros de poder e é assim que o executivo se distingue do legislativo, respondendo aquele perante este, ou que o poder de acusar que o Estado detém está separado do de julgar, respectivamente corporizados no Ministério Público e nos Tribunais. 
O principal objectivo desta disposição é impedir a tirania, isto é, o poder de alguém ou de alguma facção, ou a imposição de um único ponto de vista, mesmo representativo de opiniões e escolhas maioritárias. 
A livre escolha dos cidadãos trata-se muito simplesmente da possibilidade de eleger os dirigentes e, tacitamente, pressupondo a rotatividade da ocupação dos cargos de poder, por conseguinte, a prerrogativa de os arredar pacificamente se for essa a vontade da maioria dos eleitores. 
Sempre que isto é empiricamente observável, estamos em presença de um regime democrático. 

A sociedade democrática é aquela que se estrutura a partir destes princípios e que por isso mesmo faz da negociação o ponto de partida das suas instituições mais relevantes. Não é que por isso ou para isso se tenha que partir da defesa dos mais fracos. Mas a sociedade democrática só se realiza quando os mais fortes encontram sólidas barreiras que os impedem de destruir aqueles. No lar e nas ruas, nas escolas e nas empresas, nos organismos cívicos ou públicos, a sociedade democrática é aquela que tem em si os mecanismos e os equilíbrios que dão garantias aos mais fracos que, por o serem, não serão eliminados. 
Se isto acontecer sistematicamente, estamos, desse modo, perante uma sociedade democrática. 

Quando estes princípios e os valores que lhes subjazem são idiossincráticos em grande parte de uma dada malha demográfica; quando, por via disso, se tem como máxima que os tecidos sociais e económicos se alicerçam para que aos mais pobres assistam as oportunidades necessárias para que, sendo essa a sua vontade, possam deixar a sua condição e para que os seus filhos tenham oportunidades reais para, por sua vez, não estarem condenados à condição dos progenitores, criamos então uma civilização democrática. 
Mundo melhor que este, não há. 



Sábado de descanso, ora ao ritmo monocórdico de uma chuva levrinhante, ora ao compasso dos pingos na protecção metálica da varanda, tarde de brincadeira com os anjinhos que agora partilham com a mãe um qualquer programa televisivo que a todas faz gargalhar. 

E eu, depois do jantar, dedicar-me-ei à preguiça de um jogo de futebol, na televisão. 



Que Deus nos acompanhe a todos. 


 Alhos Vedros 
   11/10/2003 


NOTAS 

(1) Chassey, Éric de e Outros, ABECEDÁRIO DOS ANOS TRINTA 
(2) Tocqueville, Aléxis de, DA DEMOCRACIA NA AMÉRICA 


 CITAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS 

Chassey, Éric de e Outros, ABECEDÁRIO DOS ANOS TRINTA, Tradução de Maria José Metello Seixas, Público, Lisboa, 2003 
Tocqueville, Aléxis, DA DEMOCRACIA NA AMÉRICA, Aviso à duodécima edição do Autor, Prefácio à edição portuguesa de João Carlos Espada, Nota do Editor, Tradução de Carlos Correia Monteiro de Oliveira, Revisão científica de Lívia Franco, Revisão literária de Maria João Favila Vieira Carmona, Princípia, São João do Estoril, 2002

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

domingo, 15 de novembro de 2015



MIRADOURO 37 / 2015
esta rubrica não respeita as normas do acordo ortográfico


Foto de João Ramos

Entre os espelhos do céu e da terra...

a serenidade no albergue das memórias do vivido.
A visita de reis e o dia a dia plebeu.
O chiar das mós esfarinhando o grão, o colorido dos barcos; fragatas, botes, faluas, varinos... a azáfama das bestas puxando as galeras em transportes desenfreados de cortiça e o esforço, o suor, os músculos retesados, os peitos arfantes dos carregadores dos fardos.
Havia também os gritos da rapaziada nova em mergulhos e brincadeiras e os barcos acostando suavemente chegando da pesca.
És por isso património imenso e na tua contemplação encontramo-nos com o que somos no rememorar do onde viemos.

MJC

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

O SUFISMO: SABEDORIA E MÍSTICA


Curso em horário pós-laboral (começa a 23 de novembro)

Este curso visa proporcionar aos alunos as ferramentas básicas para se estudar o Sufismo, ou misticismo-esoterismo islâmico, nos seus aspetos fundamentais bem como nalgumas suas vertentes mais caraterísticas.
Especial atenção será dada aos princípios espirituais e iniciáticos do Sufismo assim como ao ensinamento de alguns importantes mestres sufis: o poeta e dervixe Rumi; o místico e metafísico Ibn al-Arabi; e a mulher sufi Rabia al-Adawiyya.
Além disso, será abordada a presença do Sufismo no Gharb al-Andalus (parte do atual território português) e ainda à maneira como a sabedoria sufi pode atender a algumas questões cruciais da atualidade, quais a relação entre homem e natureza e o diálogo inter-religioso.
Uma sessão especial será dedicada à presença da poesia sufi no espólio e na obra de Fernando Pessoa.
Programa (8 aulas)
  1. Fundamentos do Sufismo: Unidade Divina
  2. Fundamentos do Sufismo: Gnose, Via Iniciática e Práticas
  3. Ibn al-Arabi e o Sufismo no Gharb al-Andalus
  4. Rumi: Poesia Sufi e Dança Dervixe
  5. Sufismo e Encontro entre Religiões
  6. Mulheres Sufis
  7. Sufismo, Natureza e Ecologia
  8. Ecos sufis na obra de Fernando Pessoa
Quando e onde: Segundas-feiras, 20h – 22h (23 nov. - 14 dez.; 11 jan. - 1 fev.); Coração do Mundo – Centro de Estudos e Práticas para o Despertar da Consciência, Av. Almirante Reis, 174, 2º D – Lisboa
Valor da inscrição: € 80,00
Organização e Inscrições: Círculo do Entre-Ser (inscricoes@circuloentreser.org)

Docente: Fabrizio Boscaglia (CFUL)

Mais informações: clicar aqui

quinta-feira, 12 de novembro de 2015


doces sagrados


a minha esposa linda, dez anos festivos, Solange

doces sagrados na essência da insónia procuro o sossego
nas tuas pernas de voo como um castelo de neve europeia
de casa de  sono na Eslováquia onde começou agora a estrela
procuro-te na raiz mais funda de  onde se vê o umbigo

será no teu peito a lua redonda e única a torcer o cachecol
bem vermelho como o teu cabelo louco, baixo os braços e as
mãos na flor da primavera o brilho de ser cavaleiro entre os
caminhos do oceano  


José Gil

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Poemas com Música



DOS MISTÉRIOS...

TRÊS

Acertar o passo com a "lei natural".
Aquietar a mente, 
Pacificar o coração.
Amar Tudo acima de todas as coisas,
Amar cada parte como se de Tudo se tratasse.


Luís Santos


Clicar AQUI para ouvir música


terça-feira, 10 de novembro de 2015

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

A IDA AO DENTISTA 


Ui! Não há cão nem gato que não se atire ao Procurador. 
Porque será? 



E os homens do PS, num espectáculo que seria vergonhoso se não viesse da parte de pessoas que gostam de ver-se ao lado de alguém como Pinto da Costa, insistem em querer ver o texto de um acórdão que deu provimento a um recurso substituir-se a uma sentença de tribunal. 
É o entendimento que esta gente tem do estado de direito. 

E ao melhor estilo da táctica do agarra que é ladrão, depois de fazerem de um deferimento uma absolvição, querem fazer acreditar que não estão a politizar a justiça, ao mesmo tempo que lançam anátemas sobre a acusação. 
Acontece é que os factos são cruéis para quem tem estas palavras. 
Mesmo dando de barato que até ao momento não tenha havido, por nenhuma das partes, qualquer tentativa para o fazer, não será politizar o problema a atitude de uma pessoa que, ao ser posta em liberdade após meses de prisão preventiva, em vez de se dirigir para o lar, como faria qualquer cidadão normal, tenha escolhido precisamente o parlamento para primeiro local de visita e o espaço próprio aos desabafos da alma e a apresentação das suas impressões e pontos de vista e onde foi recebido em apoteose pelos correligionários? Quase só faltou apontarem o herói liberto das grades de uma qualquer prisão política. Chegou-se ao cúmulo de vermos o advogado de defesa – que não consta ter algum vínculo orgânico com aquela câmara – dar uma conferência de imprensa no interior do edifício da Assembleia da República, na qual, ironicamente, voltou a sublinhar tão cândida postura; pois não é isso uma politização da questão? E depois o que se seguiu, com o Lacão e todos os lacões desta nossa opinião publicada, não é isso a materialização daquilo que, pela negação, se pretende esconder? 

O drama está em que a frieza da análise nos diz que eles têm razão. É que esta opereta de mau gosto está para lá da intenção em causa. Vinda de quem vem, nada mais é que a defesa, dada a situação, aguerrida e ostensiva da partidocracia, deste regime partidocrático que eles criaram para se manterem no poder e perpetuarem e avolumarem os privilégios que usufruem. A representação popular é um álibi e um disfarce. Eles não estão a representar o povo; eles estão lá para que interesses poderosos não se vejam beliscados nos seus cabedais e propósitos e sabem bem que devem os lugares e prebendas a essas fidelidades esconsas e, para que tudo permaneça a contento, também não ignoram que em última instância recorrerão às medidas drásticas, mesmo que estas consistam em impor uma verdade ao poder judicial. 
Provavelmente, este pessoal não está a politizar coisa alguma mas tão só agindo segundo os seus princípios políticos e valores morais que, embora não revelados estão lá, bem no âmago, sempre que a loja fecha e eles deixam de atender ao público. 


Ai Portugal que és um país 
mesmo do outro mundo, 
tão pertíssimo do triz 
de te estatelares lá no fundo. 



E a vida que tem tantas e tantas maravilhas, tantas coisas misteriosas com que nos podemos deleitar e assim alimentar o espírito e preencher as horas do dia a dia. 

Ver o crescimento de um ser humano é tão empolgante. 
Ainda mais quando é uma parte de nós. 

“-Uau, Margarida! Já consegues fazer palavras cruzadas? Parabéns, filha!” –E o pai vergou ligeiramente o tronco para beijar aquela cabecinha, debruçada sobre a revista de passatempos em que ia escrevendo as letras dos sinónimos. 



A Matilde apreciou a manhã de folga. 
Brincou, viu um programa infantil na televisão e até teve tempo para fazer desenhos que ofereceu aos pais. 


É uma alegria almoçar em conversa com esta pardalada. 


À tarde foi ao dentista, melhor será dizer à dentista, com a mãe. 
Fez um primeiro exame oral que nos deixa tranquilos. Os dentes estão em bom estado, não têm cáries e a substituição processa-se com toda a normalidade. 



Após o jantar os pais decidiram tomar o café na esplanada e as irmãs convidaram a Beatriz para brincarem no largo. 



Devo dizer que estou de acordo com Pacheco Pereira sobre a importância e a necessidade de se efectuar um referendo sobre a constituição europeia e ainda sobre a preferência em separar o escrutínio do mesmo dia daquele em que ocorrerá o próximo acto eleitoral para a Assembleia da República. 
As implicações que um tal documento pode ter merecem uma discussão separada. Caso contrário, em vez de termos alguma probabilidade de escutarmos e apresentarmos ideias, estaremos remetidos para os slogans e a gritaria. 

E os portugueses que precisam tanto de cultura e educação cívica. 



Tanto quanto para os iranianos a quem, em primeiro lugar, deve servir de exemplo a laureada com o Nobel da Paz deste ano, Shirina Ebádi, de quem nada mais sei do que aquilo que a seu respeito li na imprensa, mas o suficiente para dizer que também é uma referência para o mundo. 
Trata-se de alguém que se distinguiu pela defesa dos direitos humanos naquele país e que foi a primeira mulher a exercer o cargo de Juiz num Tribunal, em Teerão. Sucedeu isso no tempo do regime anterior, posição de que foi destituída após a revolução islâmica. 
Significa isto que aquele país regrediu. 
   

   Alhos Vedros 
     10/10/2003

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

REAL... IRREAL... SURREAL... (157)


        “LA GOMMEUSE” (1901), DE PABLO PICASSO
           RETRATO DE PERE MANACH

                                                  
PORMENOR DE “LA GOMMEUSE”

 Dois pelo preço de um

O milionário americano Bill Koch comprou o quadro, “La Gommeuse”, do “Período Azul” de Picasso e, só muitos anos mais tarde, descobre que debaixo do forro, no lado inverso da tela, estava outra pintura, um retrato do amigo do artista, Pere Manach.
Picasso, artista pobre, com apenas 19 anos, com dificuldades em comprar material de pintura, pediu ao amigo que lhe devolvesse a tela para a reutilizar.
E foi uma reciclagem perfeita: “La Gommeuse” foi arrematada na passada quinta-feira por US$ 67,5 milhões em leilão da Sotheby's, em Nova Iorque.
Foi um belo negócio, atendendo a que o quadro foi comprado em 1984 por US$ 2,15 milhões!

António Tapadinhas



domingo, 8 de novembro de 2015



MIRADOURO 36 / 2015
esta rubrica não respeita as normas do acordo ortográfico.



UMA VELHA HISTÓRIA


Nove horas da manhã. Veio na minha direcção; o andar e o falar excêntricos como podem ser excêntricas uma perna e uma boca que mal obedecem: talvez um AVC - mas ela era tão nova - ou poliomielite e ressaca? Talvez.

Um olhar de súbito cravado na porta do supermercado; que o segurança a tem enxotado como a um cão vadio. Depois, a abordagem e deu-me as únicas coisas que tem para dar: um sorriso incerto e desdentado, mau hálito, cheiro a urina a estrelas e a solidão: em dez metros estava contada a sua vida.

José Jorge Vinha

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Silvas e Amoras


por Miguel Boieiro

Uma silva, duas silvas
Formam uma mata fechada.
Uma pica, a outra arranha
Com silvas não quero nada


Esta quadra popular ilustra admiravelmente duas das particularidades deste arbusto persistente que prolifera em sebes, bosques e valados por todo o território português: a sua extraordinária e exuberante vitalidade e a grande quantidade de espinhos de que é provido e que nos causam arreliantes dissabores. Não obstante, esta planta é uma verdadeira amiga.

A silva integra-se na família das Rosacea e possui a designação científica de Rubus fruticosus L. O género Rubus é dos mais profícuos e complexos dando origem a centenas de espécies e de híbridos. Contudo, quase nos dispensamos de descrever este arbusto espinhoso e terrivelmente invasor, pois ele é sobejamente conhecido e toda a gente tem presente as suas guias agressivas que crescem emaranhando-se umas nas outras.

As folhas são pecioladas com número ímpar de folíolos verdes escuros, dentados e levemente esbranquiçados no verso. As flores, aos cachos, apresentam-se brancas ou cor-de-rosa, muito lindas, mas sem odor. Atraentes são os seus frutos que formam drupas carnudas e cuja cor vai mudando do verde para o rosa, depois para o vermelho e finalmente para o negro azulado quando logram amadurecer. São as apetecíveis amoras silvestres que nos deliciam quando vagueamos pelos campos. É bem bonito de se ver um silvado em agosto ou setembro, cheio de reluzentes amoras.

Se as silvas, outras virtudes não tivessem, bastavam-nos com os seus doces frutos, levemente adstringentes, ricos em vitaminas e sais minerais. As amoras servem para confecionar compotas e doces muito apreciados, adquirindo uma coloração bem escura. Todavia, por serem silvestres, garantem-nos, à partida, uma certeza: não estão, em princípio, contaminados com produtos tóxicos, como acontece amiudadas vezes com outros frutos cultivados.

Também servem para fazer xarope, espremendo-se as amoras e juntando o dobro do seu peso em açúcar “mascavado”. A mistura é fervida em lume brando até se obter a necessária consistência xaroposa. É ótimo para debelar diarreias.

Igualmente se empregam as folhas e as flores em tratamentos fitoterapêuticos, mediante infusões, pois são diuréticas, adstringentes, anti-inflamatórias e hemostáticas e portanto, adequadas para dispepsias, expectorações sanguíneas, cálculos da bexiga, diarreias e diabetes.

Convém coar as infusões por causa dos espinhos que se soltam das folhas. De grande utilidade são também os gargarejos, usados para anginas, estomatites, aftas, rouquidão, faringites e gengivites.

A análise química da planta detetou a existência de ácido salicílico, ácido málico, ácido cítrico, taninos, pectinas, vitamina C e provitamina A. Existem para cima de quatrocentas espécies de Rubus em todo o mundo em função da variação do clima, da humidade e da exposição solar. Todas elas possuem características semelhantes e são igualmente úteis.

A terminar, relato um episódio engraçado. Quando fiz o lançamento oficial do meu livro “As Plantas, Nossas Irmãs”, preparou-se o habitual beberete da praxe. Lembrei-me então de apresentar uma infusão de amoras silvestres, mas para que não pensassem que era algo de reles, coloquei no cardápio a designação científica. Ficou assim: chá de rubus fruticosus. Ora, toda a gente gostou e chorou por mais, julgando que era algo de muito sofisticado.